O custo da língua: bolsonarismo sinaliza veto à aliança em caso de críticas de Ciro a Bolsonaro – Inácio Aguiar

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As declarações recentes de Ciro Gomes (PDT), com críticas a Jair Bolsonaro e a parte do bolsonarismo, jogam luz sobre uma característica do ainda pedetista que dificulta a manutenção de alianças: a franqueza incômoda. O tom crítico, por vezes exacerbado e ofensivo, que já incomodou os petistas cearenses no passado recente, agora gera desconforto à direita e pode minar a possibilidade de uma frente unificada de oposição. 

A base bolsonarista dá sinais de que não aceita qualquer posição crítica ao ex-presidente. Isso está nas entrelinhas do anúncio feito pelo deputado federal André Fernandes (PL), na sexta-feira (18), de que o partido terá candidatura própria ao Governo do Ceará em 2026, descartando o apoio a Ciro ou Roberto Cláudio no primeiro turno. 

O veto de Fernandes, que assumirá a presidência estadual do PL, segue repercutindo nos bastidores. Teria sido apenas uma divergência pontual ou um recado ideológico definitivo?

Entre os bolsonaristas, declarações como a de Ciro, ao chamar de “burros” os apoiadores de Trump no episódio do tarifaço ou ao afirmar que lulistas e bolsonaristas “só pensam em eleição”, foram lidas como ofensas. E no universo bolsonarista, ao que indica o episódio recente, a fidelidade ao líder é condição de pertencimento.

Dilema constante para o ex-ministro 

Esse cenário contrasta, em parte, com a experiência que Ciro teve quando era aliado do PT no Ceará. Durante anos, mesmo atacando Lula com dureza no plano nacional, conseguiu manter uma aliança com a base petista local. O pragmatismo eleitoral permitiu que as críticas fossem absorvidas em nome de um projeto comum. 

Agora, no campo bolsonarista, a lógica parece ser outra. O confronto com Bolsonaro não é admitido nem como estratégia. O personalismo em torno do ex-presidente cria um ambiente no qual não há espaço para alianças com quem não repita o discurso padrão da base. E, mesmo que Ciro tenha ensaiado uma aproximação, como quando foi elogiado por Fernandes, bastaram algumas declarações para a ponte ruir.

O difícil reposicionamento de Ciro 

Mesmo que o racha não seja definitivo, o episódio revela um novo limite enfrentado por Ciro Gomes em sua tentativa de reposicionamento político. A crítica, que sempre foi sua marca e até um diferencial no debate público, transformou-se em obstáculo na articulação com grupos que exigem mais permissão do que diálogo. 

Se antes da crítica, ainda que dura, cabia dentro de alianças pragmáticas, agora ela passou a ser um fator de exclusão. E isso é mais um elemento a ser considerado nas fronteiras do jogo político no Ceará.

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