Expresso 150: desembargadores investigados receberam quase R$ 20 milhões em salários em 10 anos – Segurança

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Nos últimos 10 anos, desde que a Polícia Federal deflagrou a primeira fase da ‘Operação Expresso 150’, um grupo de cinco desembargadores investigados por suposto envolvimento na venda de liminares nos plantões do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) receberam, juntos, pelo menos R$ 20 milhões oriundos dos cofres públicos.

Enquanto as apurações acerca do esquema se desdobrava, todos esses magistrados foram aposentados, em parte de forma compulsória, um tipo de punição prevista nos casos de infração administrativa grave. O pagamento continua até mesmo para aquele que foi condenado e preso por negociar as sentenças.

Por década, os desembargadores Carlos Rodrigues Feitosa, Paulo Camelo Timbó, Sérgia Maria Mendonça Miranda, Francisco Pedrosa Teixeira e Váldsen da Silva Alves Pereira tiveram depositados em suas contas cerca de R$ 4 milhões, cada. 

A reportagem do Diário do Nordeste chegou aos dados por meio de consultas de centenas de tabelas disponibilizadas no Portal da Transparência do Tribunal.

Em 2017, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) decidiu manter outros benefícios aos desembargadores

Feitosa foi um dos primeiros a ser apontado como participante do esquema. Ele é o único desembargador que chegou a ser preso, até mesmo mais de uma vez, tendo a prisão mais recente acontecido já neste ano de 2025.

Carlos Feitosa foi denunciado por negociar com advogados a venda de um habeas corpus para o traficante Djair de Souza Silva, no valor de R$ 150 mil.

Em setembro de 2018, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aposentou compulsoriamente Carlos Feitosa. Meses depois, em abril de 2019, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) o condenou a perda do cargo. Neste ano de 2025, o presidente do TJCE, Heráclito Vieira de Sousa Neto, assinou portaria tornando pública a decretação da perda do cargo “em decorrência do trânsito em julgado do acórdão condenatório proferido pelo STJ”.

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Conforme o ofício que o Diário do Nordeste teve acesso, fica determinada a comunicação do ato à Procuradoria-Geral do Estado do Ceará e à Procuradoria-Geral da Justiça do Estado do Ceará. No entanto, a cassação da aposentadoria ainda dependerá de uma decisão do Juízo da 12ª Vara da Fazenda Pública.

A reportagem procurou a defesa do desembargador, mas não recebeu resposta.

AFASTADOS DAS FUNÇÕES

Em setembro de 2016, dois desembargadores foram afastados das funções: o Francisco Pedrosa Teixeira e a Sérgia Maria Mendonça Miranda. Na época, ficaram proibidos, inclusive, de entrar nos próprios gabinetes. Dois anos depois, o Pleno do TJCE abriu Processos Administrativos Disciplinares (PAD) para a apuração da prática de “infrações a deveres funcionais e éticos” da dupla. 

A reportagem entrou em contato com a Associação Cearense dos Magistrados (ACM), que disse não ter acesso, “conhecimento e autoridade institucional para se manifestar sobre a questão da Expresso 150 uma vez que os processos envolvendo os desembargadores tramitaram no TJCE, no caso dos disciplinares, e no STJ, em Brasília, no caso dos criminais, em razão do foro por prerrogativa de função.”

Já em abril de 2019, a desembargadora Sérgia Maria Mendonça Miranda foi condenada à aposentadoria compulsória, com aplicação dos vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, pelo Pleno, em uma sessão que se prolongou por quase sete horas. Todos os 38 desembargadores presentes no momento acompanharam o relator e votaram pela condenação da magistrada no processo administrativo pela prática dos crimes de advocacia administrativa, tráfico de influência e corrupção passiva.

Em 2020, foi a vez do CNJ decidir transformar em aposentadoria compulsória a aposentadoria voluntária do desembargador Paulo Camelo Timbó.

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A reportagem também procurou o CNJ, que disse que há processos administrativos instaurados em algum momento em desfavor dos magistrados Carlos Rodrigues Feitosa, Paulo Camelo Timbó, Sérgia Maria Mendonça Miranda e Francisco Pedrosa Teixeira, mas não necessariamente se referem à investigação de venda de liminar no TJCE.

Em 2024, a desembargadora aposentada do TJCE Sérgia Maria Mendonça Miranda foi absolvida da acusação de corrupção passiva, por decisão da 5ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza. Conforme o TJCE, ela ainda responde a uma Ação Cível de Improbidade Administrativa, que está em tramitação na 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza.

O Tribunal disse em nota que também seguem em aberto Ação Cível de Improbidade Administrativa contra o desembargador Váldsen da Silva Alves Pereira, tramitando na fase de instrução, na 10ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza; e contra Francisco Pedrosa, na 14ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza, na fase de instrução processual.

Váldsen foi condenado em 2024, com pena de dois anos e quatro meses de reclusão, substituída por prestação pecuniária (pagamento de salários mínimos) e prestação de serviços à comunidade.

As defesas de Sérgia Miranda, Paulo Timbó e Francisco Pedrosa foram procuradas e destacaram a inocência dos magistrados, tendo o advogado de Timbó dito que o magistrado sequer chegou a ser denunciado pelo Ministério Público.

O advogado de Váldsen da Silva Alves Pereira não respondeu até a edição desta matéria. 

O QUE É A APOSENTADORIA COMPULSÓRIA

Conforme o CNJ, a aposentadoria compulsória é a mais grave das cinco penas aplicáveis aos magistrados vitalícios. A punição é prevista na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman).

A aposentadoria compulsória pode ser aplicada pelo Tribunal onde o magistrado atua ou pelo próprio Conselho Nacional de Justiça. 

São mantidos os ganhos proporcionais e depois de três anos o aposentado fica liberado para exercer a advocacia ou cargo público, exceto magistério superior. 

A série de reportagens sobre os 10 anos da Operação Expresso 150 tem continuidade no Diário do Nordeste nesta segunda-feira (16), trazendo a situação dos advogados envolvidos na investigação.

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